24 de abr. de 2010

Ventos de agora

O vento assobia passando pelos vidros da porta que não fecha porque está estragada - arrumá-la passou a ser urgente nos últimos dias. Ele vem soprando, forte,de uma maneira assustadora! Mesmo alguém como eu acostumada com o minuano e com a geada partida entre as pisadas dos tamancos quando, ainda criança, caminhava quilômetros para chegar à escola, não reconhece o vento de agora. Eu ia acompanhada, de longe, pelo cheiro do café servido no bule de alumínio que a mãe acabou de coar no ardor da chapa do fogão à lenha – onde muitas vezes me senti acolhida como que em braços paternos que voltam a aninhar filhos desgarrados. 

Mesmo pessoas assim como eu acostumadas com o pior dos ventos, não entendem os ventos de agora.

Não é o minuano. Nem chega a ser tão gelado, embora se pareça com algo bem furioso também.
Essa é a palavra mais adequada para o vento de agora: furioso. 

É esse vento que nos visita nos últimos dias aqui em Porto Alegre.

Ele sopra balançando o vestido que acabei de pendurar no varal e que como bailarina desajeitada dança em movimentos alternados, impressivos e rápidos. Por vezes chega a voar.

Esse vento insiste em derrubar árvores, agitar marés e destelhar até mesmo o  abrigo improvisado dos que nem teto teem. 
Esse vento trás consigo um mistério que não é de inverno, nem de verão, nem de tempestades. Será de primavera?

Isso me faz pensar na quantidade de vezes que já ouvi falar que o mundo ia acabar.
Tanto foi falado e feito por nós, os humanos, que de fato, o mundo está acabado! Pelo menos aquele tipo de mundo que conhecemos e com o qual acostumamos a sonhar, a viver, andar, mesmo com a geada cortando os pés ainda pequenos. E é esse mundo que estamos ajudando a destruir.

Será que sentiremos saudades do tempo em que todos os ventos, mesmo os mais ferozes, tinham lá seus encantamentos?
Os ventos não são mais os mesmos!

Volto logo.
Vou lá pegar um cobertor.

(Preta, inverno 2009 - Porto Alegre)

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